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Foto do escritorLucas Sabatier

QUANDO A BONDADE NÃO FAZ SENTIDO

Se você viver o suficiente, você vai sofrer. Se você aconselhar por tempo suficiente, ouvirá algumas histórias de sofrimento inimaginável. Nossa consciência da decadência da ordem em que vivemos deveria, em teoria, evitar nosso choque ao ouvir as dores de nosso aconselhado. Muitas vezes, esse não é o caso. Algumas histórias são de cair o queixo.


Algumas circunstâncias nos lembram dos dias terríveis narrados no final do livro de Juízes. “Não havia rei em Israel. Cada um fazia o que parecia bem aos seus próprios olhos” (Jz 21:25). As atrocidades se multiplicaram à medida que a maldade dos homens se tornava cada vez mais evidente, a tal ponto que até a leitura de uma narrativa como a do levita e da concubina nos deixa arrepiados (ver Juízes 19).


Mas então, nos encontramos encolhendo-nos mais uma vez na cadeira de aconselhamento. Ouvimos histórias sobre abuso sexual infantil, autoritarismo espiritual, traições conjugais em série e tantos outros males que são difíceis de acreditar. No entanto, como conselheiros, estamos apenas “lendo” a história. Diante de nós está sentado um irmão ou irmã que está passando por essas dificuldades, e cada golpe de dor é um desafio à sua fé: “Onde está o seu bom Deus?”


Quando a bondade não faz sentido (ou, para os nossos sentidos), o conselheiro bíblico é responsável por lembrar o aconselhado aflito do resto da história. Para sermos bíblicos em nosso aconselhamento, devemos ajudar o aconselhado a contextualizar sua experiência humana, por mais desafiadora que seja, dentro dos quadros da história redentora. Essa contextualização envolve pelo menos três cenas: 1) o sofrimento atual do aconselhado, 2) o sofrimento redentor de Cristo e 3) o prometido fim do sofrimento com a volta do Rei.


PRIMEIRA CENA — SENTINDO O MAL


O problema do mal dói mais no nível experiencial. Sim, a teodiceia envolve vários desafios lógicos para os acadêmicos discutirem. A dificuldade desses desafios teóricos não se compara, porém, ao que é vivenciado por quem passa por períodos de intensa dor e sofrimento. Para os aflitos, as circunstâncias parecem gritar momento após momento em acusação: “Onde está o seu Deus?” (Sl 42:3, 10).


O conselheiro sábio não usará essa verdade de Romanos 8:28 loquazmente ou muito rapidamente. Sim, nós acreditamos que Deus está fazendo todas as coisas para aqueles que O amam. No entanto, a compaixão e a empatia reconhecem a dor experiencial e - mais - reconhecem a maldade do mal. Compreender a confusão teológica do nosso aconselhado é essencial para que o conselheiro bíblico funcione como um guia de orientação. Neste mundo caído, onde o pecado se opõe à natureza e à razão, há muito que não chega aos nossos sentidos.


SEGUNDA CENA — A CRUZ DO BEM E DO MAL


O evento mais maligno da história do mundo é também aquele que demonstrou o maior amor. Na cruz, a maldade deste mundo caído foi mais drasticamente demonstrada quando Ele, que é a própria bondade, foi desprezado, rejeitado e morto. Cristo foi traspassado, e ainda assim foi por nossas transgressões. Ele foi esmagado, mas Seu sacrifício voluntário foi por nossas iniquidades. Suas feridas podem curar as nossas.


Nossas provações e sofrimentos não ocorrem em desconexão com o que aconteceu no Calvário. Pelo contrário, a acusação “Onde está o seu Deus?” encontra sua resposta naquela cruz. Deus, o Filho encarnado, foi crucificado pelos pecadores, revelando de forma culminante este Senhor que certamente vê a aflição de Seu povo, ouve seus clamores, conhece seus sofrimentos e desce para libertá-los (compare Êxodo 3:7-8). O fiel conselheiro ajudará seus aconselhados a compreender sua dor sob a sombra (ou a luz!) daquela cruz abençoada.


TERCEIRA CENA - BONDADE TRIUNFANTE


Diferente dos tempos dos juízes de Israel, há um rei governante. Ele foi crucificado, sim. Mas este Rei governa até mesmo sobre a morte. Ressuscitado da sepultura e ascendeu para sentar-se à direita do Pai, Cristo prometeu voltar triunfante. A cena desse Rei que retorna é aquela que determina e se estende por toda a eternidade. A vitória que Ele conquistou sobre o mal na cruz será finalmente consumada e estabelecida no final. Nossas lágrimas, nossa dor, nosso luto - todas essas coisas passarão na presença do Rei (Ap 21:4). Então, em comparação com a bem-aventurança de Sua presença, nossas aflições atuais finalmente serão compreendidas como leves e momentâneas (2 Coríntios 4:17-18).


Compreender nosso sofrimento entre aquela segunda cena da cruz e esta terceira cena futura de bondade consumada nos permite orar adequadamente agora em lamento: “Até quando, ó Senhor?” (por exemplo, Salmos 13:1). A questão não é se existe um Deus bom. A questão não é se esse bom Deus vai intervir. A questão não é se esse bom Deus intervirá suficientemente. A segunda e a terceira cenas revelam um Deus bom que interveio e continua a intervir suficientemente e poderosamente, dando-se a si mesmo. É essa verdade que informa nosso lamento ao lamentarmos o mal, confiantes em um tempo futuro em que o sofrimento não existirá mais. E assim, embora nossa fé não negue nossa realidade maligna, ela nos dá olhos para ver além e ficar quietos (Sl 46:10-11).


CONCLUSÃO


Se a autoridade final for dada aos nossos sentidos, então as dúvidas sobre a bondade de Deus serão abundantes. No entanto, se nossa confiança na bondade de Deus depende principalmente de Sua auto-revelação especial nas Escrituras, então o aqui e agora encontra seu contexto dentro da estrutura da cruz e do retorno triunfante de Cristo. Os conselheiros agem como guias sábios quando conduzem seus aconselhados a uma maior consciência de sua localização na história da redenção. Por meio dessa consciência, conselheiros e aconselhados direcionam suas respostas de vida como louvor à bondade eterna de Deus e Seu amor inabalável - mesmo quando não chega aos nossos sentidos experimentais.


PERGUNTAS PARA REFLEXÃO


Você já aconselhou alguém lutando para acreditar na bondade de Deus à luz de alguma forma de sofrimento extremo? Como você ajudou aquele aconselhado?


Como você usaria a história da redenção para contextualizar sua instância dolorosa particular para seu aconselhado?



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